Os argumentos a favor e contra a comercialização dos novos produtos do tabaco no Brasil

Um estudo do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP) procurou conhecer os argumentos utilizados pelos defensores e os opositores à comercialização e marketing de cigarros eletrónicos e de tabaco aquecido no Brasil, nos três momentos em que houve discussões políticas sobre o tema (2009, 2018 e 2019), com vista a criar legislação relacionada com o consumo destes novos produtos do tabaco.

O objetivo? Facultar informação que possibilite prever e responder aos argumentos apresentados em contexto de definição de políticas de controlo do consumo de produtos com nicotina.

O contexto brasileiro

O Brasil é um dos principais produtores de tabaco a nível mundial e a indústria tabaqueira tem um peso relevante na economia do país.

Nos anos 80 do século XX, foi implementada uma política muito intensiva de controlo de tabaco no país, que levou a uma importante redução da prevalência do consumo deste produto entre a população.  

Em 2008-2009, foi proibida a comercialização e o marketing de cigarros eletrónicos e de tabaco aquecido, após uma consulta pública realizada pela Anvisa, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária brasileira. Após pressão da indústria tabaqueira, em 2018 e 2019 retomou-se a discussão política sobre o tema, com o objetivo de rever a legislação em vigor.

Nestes três momentos foram ouvidos vários intervenientes, nomeadamente a indústria tabaqueira, associações de consumidores, políticos, sindicatos dos trabalhadores da área, profissionais de saúde pública, associações médicas e universidades. Nestes momentos foram apresentados argumentos a favor e contra a comercialização e marketing dos novos produtos de tabaco, com vista a influenciar a manutenção ou a criação de uma nova legislação.

Segundo Teresa Leão, investigadora do ISPUP, que coordenou o estudo publicado na revista Tobacco Control, “quisemos perceber quem foram os intervenientes que estiveram envolvidos nas discussões políticas sobre a comercialização e marketing de cigarros eletrónicos e de tabaco aquecido, nos três anos em que houve debates públicos sobre o tema – 2009, 2018 e 2019 – e analisar qual o seu posicionamento e as razões apresentadas por quem era a favor ou contra a comercialização destes produtos. Paralelamente, analisámos se houve uma alteração nos argumentos utilizados pelos vários intervenientes ouvidos, no período de dez anos que separou as sessões de audiência pública”.

Os defensores e os opositores

Entre os defensores da comercialização e marketing dos novos produtos do tabaco encontravam-se a indústria tabaqueira, grupos de consumidores, empresas que comercializavam produtos de tabaco (como os quiosques), políticos de regiões produtoras de tabaco e sindicatos de trabalhadores.

Já entre os opositores estavam a Agência Nacional de Vigilância Sanitária brasileira, organizações de proteção de consumidores, representantes de universidades (do Brasil aos Estados Unidos da América) e instituições médicas e antitabágicas (relacionadas, nomeadamente, com a prevenção do cancro, pneumologia, oncologia, etc.).

Os argumentos usados

Os defensores da comercialização e marketing destes produtos utilizaram, nas discussões políticas de 2009, argumentos relacionados com a diminuição dos malefícios dos cigarros eletrónicos e do tabaco aquecido face ao tabaco convencional, e, nas sessões de 2018 e 2019, apontaram os benefícios da sua comercialização para a economia brasileira, a importância da legalização destes produtos para a prevenção do contrabando e para a garantia da qualidade dos mesmos.

Por outro lado, os opositores, expuseram, nas discussões de 2009, argumentos relacionados com a falta de evidência sobre a segurança dos novos produtos de tabaco para a saúde e a ausência de eficácia em ajudar a abandonar o tabaco convencional. Anos mais tarde, passaram a focar o seu discurso nas técnicas de marketing agressivas, levadas a cabo pelas empresas produtoras de tabaco, com o intuito de incentivarem o consumo destes produtos junto dos mais jovens. 

A importância do estudo

De acordo com Teresa Leão, “foi importante percebermos que a evidência científica produzida, ao longo dos anos, permitiu que fossem trazidos a debate mais argumentos de precaução, relacionados com os riscos associados a este tipo de produtos, nomeadamente junto dos adolescentes. E foi interessante verificar que, ao fim de 10 anos, as justificações de ordem moral e económica passaram a ter um maior peso no discurso de quem é a favor da comercialização destes produtos”, refere.  

Para a investigadora do ISPUP, este artigo é especialmente relevante para informar os intervenientes nas discussões sobre o controlo do consumo de produtos de tabaco. “A identificação e a análise dos argumentos utilizados por estes intervenientes, especialmente os apresentados pelas empresas de tabaco, no contexto de definição de políticas públicas, permite aos profissionais de saúde pública do Brasil e de outros países, prepararem-se para responder de forma mais assertiva a esses argumentos”, remata.

O artigo designado Arguments used by proponents and opponents in Brazil’s regulatory discussions of e-cigarettes and heated tobacco products contou também com a participação da investigadora Mônica Nunes-Rubinstein, do ISPUP.

Imagem: Unsplash/CDC

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