Estima-se que 73% da população portuguesa entre os 16 e os 79 anos apresente literacia em saúde inadequada, ou seja, tenha dificuldades em aceder, compreender e utilizar informação sobre saúde. O resultado é de um estudo conduzido por Dagmara Paiva, investigadora no Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), e médica especialista em Medicina Geral e Familiar. A investigação sublinha ainda que ensinar os profissionais de saúde a comunicar com os doentes é fundamental para atenuar o problema.
O estudo, desenvolvido no âmbito do doutoramento em Saúde Pública da Universidade do Porto, pretendeu produzir uma base para a avaliação da literacia em saúde em Portugal. Para tal, aplicou o teste Newest Vital Sign (NVS), composto por um rótulo fictício de gelado e por perguntas como “Se comer toda a embalagem de gelado quantas calorias está a consumir?”, a uma amostra representativa da população portuguesa, que incluiu 1544 indivíduos.
Constatou-se que três em cada quatro portugueses apresentam literacia em saúde inadequada e que os baixos níveis de literacia sobem com o avançar da idade. Além do mais, quanto menor for o nível de escolaridade, menos competências têm as pessoas neste domínio.
Exemplificando, na população entre os 16 e os 44 anos, a proporção daqueles que mostram níveis inadequados de literacia em saúde varia entre os 62% e os 65%. Esta percentagem vai aumentando e, na faixa etária entre os 65 e os 79 anos, corresponde a 94% da população. Relativamente à escolaridade, entre as pessoas que têm menos do que o 4º ano, 97,5% apresentam baixa literacia em saúde. Contrariamente, entre a população que possui pelo menos uma licenciatura completa a proporção de iliteracia desce para 44,5%.
A metodologia aplicada na investigação apresenta limitações. Como se explica no estudo, o NVS “foi desenhado para avaliar competências individuais de compreensão de leitura e cálculo, uma pequena parte do conceito de literacia em saúde”. No entanto, os resultados alcançados não perdem relevância. A avaliação das habilidades numéricas dos pacientes pode ser fundamental para melhorar o uso apropriado de medicamentos e prevenir erros de dosagem, o que vai ao encontro dos objetivos do Programa Nacional de Educação para a Saúde, Literacia e Autocuidados.
Melhorar as competências de comunicação dos profissionais de saúde
Para melhorar os níveis de literacia em saúde dos portugueses há que investir na educação dos cidadãos, mas também nas competências de comunicação dos profissionais de saúde, sublinha o estudo de Dagmara Paiva, que também se focou nos fatores que facilitam e inibem a comunicação entre pessoas com diabetes tipo 2 e profissionais de saúde.
Verificou-se que os doentes identificam a comunicação agressiva no consultório como uma barreira à comunicação, mas os profissionais por vezes vêem-na como um facilitador, porque entendem que esta pode incentivar à mudança de comportamentos dos doentes.
A investigadora destaca que é importante incluir disciplinas de comunicação no currículo obrigatório dos cursos de medicina, bem como nos programas de educação médica contínua, para que os profissionais consigam comunicar melhor com os pacientes.
Este último estudo, aceite para publicação na revista “Health Services Research”, salientou também que os doentes sobrevalorizam o papel da relação médico-doente como facilitador da comunicação na consulta, particularmente as competências clínicas de escuta ativa, empatia e respeito pelas suas preferências e decisões.
O trabalho intitulado Lost in translation: health literacy in type 2 diabetes mellitus care foi orientado pela investigadora Ana Azevedo e coorientado por Susana Silva, ambas do ISPUP.
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