O convite para rastreio do cancro do colo do útero, através de intervenções, como o envio de SMS, chamadas automáticas e lembretes contribui para aumentar a adesão das mulheres ao rastreio organizado e diminuir os custos inerentes ao método de convite tradicional – a carta enviada por correio.
A conclusão consta de uma tese de doutoramento, levada a cabo por um investigador do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), que testou um conjunto de estratégias de convite para aumentar a adesão ao rastreio organizado deste tipo de cancro.
Apesar de ser uma das doenças oncológicas mais preveníveis, seja através da administração da vacina do vírus do papiloma humano (HPV) ou do rastreio, o cancro do colo do útero permanece como a quarta causa mais frequente de cancro nas mulheres, em todo o mundo. Em Portugal, a adesão ao rastreio organizado é globalmente baixa, pelo que importa pensar em estratégias que aumentem a participação das mulheres no programa organizado, com um custo reduzido.
Neste sentido, “desenhámos um conjunto de estratégias de convite, que se pretendiam de baixo custo, inovadoras e mais ajustadas aos dias de hoje, para aumentar a participação das mulheres no rastreio organizado do cancro do colo do útero. Queríamos comparar a efetividade destas intervenções com o método utilizado tradicionalmente, tanto em Portugal como em outros países europeus, que é a carta remetida por correio”, explica Firmino Machado, primeiro autor do trabalho, coordenado pelo também investigador do ISPUP, Nuno Lunet.
As estratégias, pensadas com um grau crescente de personalização e custo, foram testadas junto de utentes pertencentes aos territórios do Porto Ocidental e Vila Real, mas poderiam ser perfeitamente implementadas em todo o país.
Numa primeira fase, foi testada uma estratégia 100% automática e de fácil implementação, em que se enviaram às mulheres elegíveis para o rastreio do cancro do colo do útero mensagens de texto curtas (SMS), chamadas automáticas e lembretes, com vista a motivá-las a aderirem ao programa organizado.
“Em comparação com o modelo de convite tradicional por carta, em que a proporção de resposta era de 25,7%, esta intervenção aumentou a adesão das utentes para aproximadamente 40%. Ou seja, houve um ganho de cerca de 14 pontos percentuais. Além do mais, foi possível reduzir o custo por convite dos 80 cêntimos (preço do envio por carta) para menos de um cêntimo. Aumentámos, assim, a efetividade e reduzimos os custos”, refere o investigador.
Após esta primeira intervenção, implementou-se uma segunda, dirigida às mulheres que não aderiram ao rastreio depois de terem sido contactadas na primeira fase. Foi adotada uma estratégia de chamadas manuais realizadas por secretários clínicos, em que estes profissionais ligavam às utentes, procurando motivá-las para aderirem ao rastreio.
Verificou-se, novamente, um aumento da adesão ao programa. Passou-se dos 40%, conseguidos com a estratégia anterior, para os 49%, o que representa um ganho de quase 10%. Apesar de esta intervenção ter um custo superior ao contacto por carta (87 contra 80 cêntimos, respetivamente), acabou por se revelar custo-efetiva, na medida em que houve uma subida significativa da participação.
Segundo Firmino Machado, “esta estratégia é interessante, provavelmente para as mulheres com menos literacia digital e que não estão habituadas a interagir com o telemóvel, seja através de mensagens ou da resposta a chamadas interativas”.
Por fim, e para aquelas utentes que não tinham ainda aderido ao rastreio, através das estratégias anteriores, procurou-se agendar uma entrevista presencial com o médico de família, para que este tentasse perceber quais as barreiras que levavam as utentes a não aderirem ao programa, tentando ultrapassá-las utilizando argumentos predefinidos. Esta ação, apesar de conseguir um aumento adicional da adesão quando combinada com as estratégias anteriores, acarreta um custo muito substancial, pelo que não foi considerada custo-efetiva.
“Este estudo mostrou que existem estratégias que são mais baratas e efetivas para aumentar a adesão ao rastreio do cancro do colo do útero e que deveriam ser implementas em Portugal e até em outros países europeus que ainda utilizam o modelo de convite por carta. As duas primeiras intervenções são claramente custo-efetivas e trazem ganhos tanto para o Serviço Nacional de Saúde como para as utentes. Estamos a falar da utilização de uma estratégia por convite, que é tecnológica e que está mais perto das vias de comunicação usadas hoje em dia, e que nunca tinha sido testada até agora”, adianta.
Para o investigador, o estudo “consegue informar adequadamente o decisor político. Foi possível mostrar que se podem implementar intervenções que aumentam a adesão ao programa de rastreio, de uma forma responsável e que garante a sustentabilidade do rastreio do cancro do colo do útero, em particular”.
A tese de doutoramento designa-se Reshaping organized cervical cancer screening: strategies to increase the adherence and reduce invitation costs e foi desenvolvida no âmbito do Programa Doutoral em Saúde Pública da Universidade do Porto.