O estudo “The influence of the Great Recession on perinatal health — an ecological study on the trend changes and regional differences in Portugal”, desenvolvido por uma equipa de investigadores do ISPUP, CEGOT e CAPHRI e publicado setembro no “The Lancet Regional Health – Europe ”, confirmou o impacto negativo da crise económica e financeira de 2008/ 2009 nas tendências da mortalidade perinatal e infantil em Portugal.
O estudo confirmou uma relação direta entre a Grande Recessão de 2008 e as tendências da mortalidade perinatal e infantil, observando uma desaceleração destas taxas após 2008/2009. No entanto, os autores sublinham que é necessário ter em conta outras variáveis, como os ciclos macroeconómicos, as variações nas tendências da mortalidade, a volatilidade macroeconómica e a estagnação nas tendências da mortalidade, na análise do impacto da crise económica e financeira de 2008/2009.
O presente estudo concluiu também que as tendências da mortalidade perinatal e infantil tiveram variações significativas entre as regiões NUTS II (Norte, Centro, Lisboa, Alentejo, Algarve, Região Autónoma dos Açores e Região Autónoma da Madeira) confirmando as consequências desiguais da crise, as disparidades regionais anteriormente identificadas e distribuição geográfica desproporcional dos estabelecimentos de saúde em Portugal.
O estudo alerta que esta “nova crise financeira”, que já se faz sentir, ou qualquer outra futura, contribuirá para o agravamento destas desigualdades na saúde materna, discutida num estudo anterior, publicado também na “The Lancet Regional Health – Europe ”. Os autores concluem que as crises económicas e o seu impacto no acesso e na qualidade dos cuidados materno-infantis podem impedir um início de vida saudável, especialmente quando afetam os primeiros 1001 dias de vida da criança. Afirma ainda que os contextos económicos mais adversos, provocados por estas crises, são particularmente desafiantes para as mulheres grávidas e mães solteiras das classes económicas mais baixas (muitas vezes mais jovens e com situações profissionais mais precárias) que vivem perto do limiar da pobreza e que, por isso, terão ser os primeiros a enfrentar dificuldades económicas e acesso a cuidados de saúde.
Neste sentido, Julia Doetsch , doutorada em Saúde Pública e primeira autora deste estudo, deixa-nos a pensar na questão-chave que nos coloca esta investigação: “ O que pode ser feito para mitigar a influência da crise nas tendências da saúde perinatal, tirando as desigualdades regionais pré-existentes em Portugal em conta?” Os autores deste estudo propõem-se olhar para os impactos da crise e a aprender com eles, com o objetivo final de indicar implicações concretas que possam ajudar a desenhar políticas que melhorem a disponibilidade, o acesso e a utilização dos cuidados de saúde pré-natais. Neste contexto, o estudo apresenta três implicações políticas principais, das conclusões acima apresentadas, para Portugal:
Por fim, o estudo reforça que, embora o acesso a cuidados pré-natais e infantis públicos possa mitigar as consequências para a saúde das dificuldades económicas vividas em tempos de crise, isso não é suficiente por si só. “A disparidade observada nos indicadores perinatais, entre regiões, deixa clara a necessidade de adoção de medidas específicas (por exemplo, programas comunitários) para superar estas desigualdades, particularmente em períodos de crise, em que se acentuam as desigualdades pré-existentes”, conclui. Julia N. Doetsch.