O estudo – Effects of a stigma reduction intervention on help-seeking behaviors in university students: A 2019-2021 randomized controlled trial – conduzido por uma equipa de investigadores do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto e publicado, recentemente, na revista Psychiatry Research, procurou estudar os efeitos de uma intervenção de redução do estigma nos comportamentos de procura de ajuda de estudantes universitários com sintomas de depressão e ansiedade. As conclusões mostraram que os estudantes universitários com sintomas de depressão e ansiedade procuram ajuda mais frequentemente após serem expostos a uma intervenção de redução do estigma em relação à doença mental e que esse incremento no acesso aos cuidados saúde se manteve, mesmo sob o efeito do impacto da pandemia de COVID-19.
De acordo com a contextualização do presente estudo, a fase universitária expõe os jovens a vários fatores de risco psicossociais, como as saudades de casa, os problemas de acomodação e adaptação, a pressão para ter sucesso académico, entre outros, sendo que coincide ainda com a idade média de surgimento de algumas perturbações psiquiátricas. Além disso, a deterioração da saúde mental dos estudantes universitários está fortemente associada ao risco de baixo desempenho académico e ao abandono escolar.
A evidência científica existente sobre os comportamentos de procura de ajuda de estudantes universitários que se debatem com questões de doença mental sugere uma acentuada relutância em pedir ajuda profissional quando surge essa necessidade, representando assim um desafio fundamental à implementação de intervenções precoces eficazes. As barreiras à procura de ajuda mais frequentemente identificadas são atitudes e comportamentos a nível pessoal que afetam as decisões de saúde, como o estigma e o constrangimento na procura de ajuda e a fraca literacia em saúde mental.
O estigma é, de facto, uma das barreiras à procura de ajuda mais frequentemente identificadas na literatura, mas existe ainda uma lacuna na evidência científica sobre os efeitos das intervenções de redução do estigma nos comportamentos de procura de ajuda em saúde mental durante os principais anos da vida universitária. Neste sentido, e tendo por base o trabalho anterior já desenvolvido pela mesma equipa de investigadores neste domínio – que examinou os efeitos das intervenções anti-estigma no estigma da depressão e nas atitudes de procura de ajuda – este estudo procurou explorar de forma mais profunda os efeitos longitudinais destas intervenções nos comportamentos de procura de ajuda. Assim, os investigadores avaliaram (a) os efeitos de uma intervenção de redução do estigma da depressão nos comportamentos de procura de ajuda dos estudantes universitários entre 2019 a 2021, (b) os efeitos da intervenção no acesso aos cuidados de saúde mental, analisando especificamente como este acesso variou com base na gravidade dos sintomas depressivos e ansiosos e se (c) os efeitos esperados mudaram com o início da pandemia.
Este estudo decorreu entre 2019 e 2021 e baseou-se numa metodologia de ensaio controlado randomizado que incluiu 702 estudantes dos vários cursos da Universidade do Porto, com uma idade média de 19 anos.
Os resultados revelaram que a redução do estigma contribuiu para aumentar os comportamentos de procura de ajuda em cerca de 10% ainda antes do início da pandemia e que os comportamentos de ajuda melhorados se mantiveram mesmo depois do início da pandemia. Paralelamente, foi observado um aumento significativo da sintomatologia ansiosa e depressiva moderada e grave após a pandemia, no entanto os estudantes que apresentaram menores níveis de estigma e que mais procuraram ajuda demonstraram estar mais protegidos, revelando um menor prejuízo na gravidade dos sintomas.
O estudo sublinha a eficácia duradoura das intervenções focadas na redução do estigma e baseadas na evidência científica, mesmo em períodos desafiantes como o da pandemia COVID-19. Os estudantes que participaram da intervenção não apenas procuraram mais ativamente cuidados de saúde, mas também mostraram maior resiliência perante os desafios de saúde mental, comparativamente aos que não participaram.
O estudo destaca ainda a importância das abordagens preventivas e proativas no âmbito da saúde mental no contexto educacional. “A persistência dos efeitos positivos da intervenção aponta para a necessidade de políticas e programas contínuos que visem a redução do estigma e a promoção da procura de ajuda eficaz como estratégias chave para o bem-estar dos estudantes”, conclui Virgínia da Conceição, primeira autora do estudo e membro do laboratório Literacia em saúde mental, bem-estar, depressão e prevenção do suicídio, do Laboratório associado para a Investigação Integrativa e Translacional em Saúde Populacional (ITR).
A equipa de investigadores aponta ainda direções importantes para futuras políticas de saúde mental em ambientes académicos, reforçando que “não se trata de fazer qualquer coisa, mas sim fazer o que é correto e baseado na evidência”. Os autores esperam também que o financiamento dos programas de saúde mental no ensino superior que recentemente foram submetidos a concurso nacional sejam apoiados em função da evidência e não do entusiasmo: “Doze milhões de euros em 3 anos para um universo de 430 000 estudantes do ensino superior não é muito dinheiro mas será um bom investimento em programas com evidência científica.”