Os resultados preliminares do projeto designado Impacto do SARS-CoV-2 nos determinantes sociais da Violência de Género: Propostas de Ação e Intervenção, financiado no âmbito da linha de apoio “GENDER RESEARCH 4 COVID-19”, foram já divulgados.
O projeto, coordenado pelo investigador José Peixoto Caldas, do Instituto de Saúde Pública da Universidade do Porto (ISPUP), foi desenhado para caracterizar as situações de violência de género das mulheres residentes na cidade do Porto.
Os investigadores entrevistaram especialistas na área da violência de género, trabalhadores de apoio social, técnicos de estruturas de apoio às vítimas e de ONG e recolheram, também, os testemunhos de vítimas de violência doméstica.
Os resultados preliminares do estudo foram apresentados, no dia 23 de março, num workshop de apresentação e discussão pública, organizado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT).
Os dados divulgados dizem respeito às perceções de dois grupos específicos em análise: profissionais pertencentes a instituições de segurança pública, ministério público e juntas de freguesia, e especialistas da academia e da ciência.
Através da realização de entrevistas em profundidade, explorou-se a perceção que estes diferentes grupos tiveram sobre o impacto da pandemia nas vivências de violência de género (em termos de prevalência, processos e dinâmicas), os desafios que instituições e profissionais passaram durante o primeiro lockdown, a avaliação que fizeram das medidas e políticas públicas implementadas para fazer frente a esta pandemia sombra, assim como as estratégias de ação que lhes pareciam fundamentais implementar.
Joana Topa, uma das investigadoras envolvidas no projeto, adianta que foram contactadas todas as juntas de freguesia da cidade do Porto, com o intuito de “perceber como decorreu este atendimento de proximidade com as cidadãs e cidadãos que fossem vítimas de violência”.
O impacto do distanciamento social e do teletrabalho na resposta aos pedidos de ajuda das vítimas
A partir das entrevistas realizadas aos especialistas, constatou-se haver uma diminuição de denúncias durante o primeiro confinamento. No entanto, tal não é significado de menos ocorrências, mas sim de um menor contacto com as autoridades. “A violência parece ter-se mantido durante a situação pandémica, apesar de se ter sentido uma diminuição do número de denúncias. Terá provavelmente sofrido grandes alterações, nomeadamente na forma como foi perpetuada, tanto na frequência, como na severidade da sua perpetuação”, acrescenta a investigadora.
Os profissionais de apoio social e das estruturas de apoio à vítima destacaram as dificuldades acrescidas que o distanciamento social e o atendimento à distância implicaram na resposta adequada aos pedidos de ajuda das vítimas de violência. Para além disso, enfatizaram o impacto da pandemia no funcionamento das suas instituições, que se traduziu numa maior carga horária e laboral para o já reduzido número de trabalhadores.
Relativamente às medidas implementadas pelo Estado, os profissionais e especialistas mencionaram a celeridade da resposta estatal através da apresentação de medidas de apoio e resposta à situação, mas entendem ser necessária uma avaliação das medidas implementadas e o planeamento na delineação de estratégias de combate à violência durante futuras situação de crise.
O contributo do projeto
José Peixoto Caldas considera que uma das mais-valias do projeto passará por usar o conhecimento adquirido para a realização de cursos de especialização na área da violência, com destaque para a violência de género. Os cursos seriam dirigidos a funcionários públicos, que se encontram em contacto direto com a população e que, ao longo das entrevistas conduzidas pelos investigadores, destacaram a falta de formação adequada como um dos principais entraves a um melhor acompanhamento das vítimas de violência. O objetivo, de acordo com José Peixoto Caldas, seria “formar quadros do Estado, nos seus determinados setores: sanitário (médicos, enfermeiros e administrativos hospitalares), jurídico e de segurança social com o intuito de empoderar estes técnicos a estarem alerta e sensibilizados”.
Serão também elaborados relatórios com os resultados finais e preparado um folder informativo direcionado, principalmente, aos profissionais sociais e de saúde, que estão frequentemente em contacto com vítimas de violência de género e carecem de informação acerca das formas de procedimento adequadas em resposta a estes casos.
O projeto, intitulado Impacto do SARS-CoV-2 nos determinantes sociais da Violência de Género: Propostas de Ação e Intervenção, é um dos 16 projetos financiados pela FCT, ao abrigo da iniciativa “GENDER RESEARCH 4 COVID 19”.
Para além do ISPUP, participam também no projeto investigadores/as da Universidade de Vigo, do Instituto Universitário da Maia (ISMAI), da Escola Nacional de Saúde Pública/FIOCRUZ e da Universidade Rey Juan Carlos de Madrid.
Imagem: Pixabay/Ulrike Mai