Um estudo do ISPUP avaliou o nível de satisfação de um conjunto de pais relativamente à silhueta dos seus filhos e constatou que estes preferiam mais frequentemente que as raparigas tivessem uma silhueta mais delgada, comparativamente com os rapazes. Na investigação, percebeu-se igualmente que os pais insatisfeitos com a sua própria imagem corporal tendem igualmente a estar mais insatisfeitos com a silhueta dos seus filhos. No entanto, 3/4 dos que tinham filhos com excesso de peso estavam satisfeitos com a silhueta das crianças.
“Estudar o nível de satisfação dos pais para com a silhueta dos filhos merece a nossa atenção, dadas as consequências que um possível descontentamento pode provocar na saúde mental e física da criança, nomeadamente, baixa autoestima, distúrbios alimentares, descontentamento relativamente ao próprio peso, sintomas depressivos, entre vários outros problemas”, explica Sarah Warkentin, primeira autora da investigação, coordenada por Andreia Oliveira.
“Tendo em conta que este impacto negativo não se faz sentir apenas na infância, mas também se prolonga ao longo da adolescência e na idade adulta, importa abordar esta questão como um problema de saúde pública”, refere.
Considerando este enquadramento, os investigadores do ISPUP avaliaram o nível de insatisfação dos pais para com a silhueta dos filhos, explorando os determinantes para tal descontentamento.
Os participantes
A investigação, publicada na revista Eating and Weight Disorders – Studies on Anorexia, Bulimia and Obesity contou com a participação de pais, mães e filhos que integram o estudo longitudinal Geração XXI.
O estudo incluiu 4930 mães e 1840 pais que avaliaram a silhueta dos seus filhos aos 7 anos de idade. Aos pais das crianças foi pedido que olhassem para um conjunto de silhuetas com tamanhos corporais diferentes e assinalassem a atual silhueta do filho (de acordo com a sua perceção) e que indicassem também a silhueta que desejavam para a criança. Paralelamente, foi avaliada a perceção que os pais têm da sua própria silhueta.
Foram analisados o peso e a estatura das crianças e explorados vários fatores que poderiam estar associados à insatisfação dos pais para com a silhueta dos filhos.
A perceção dos pais e a real silhueta das crianças
36% das mães e 31% dos pais que tinham filhos normoponderais, isto é, com um peso normal para a idade e o sexo, desejavam uma silhueta maior para as suas crianças.
Por sua vez, 74% dos pais cujos filhos apresentavam excesso de peso estavam satisfeitas com a silhueta das crianças.
“Estes resultados são surpreendentes. Percebemos que os pais não conseguem percecionar o excesso de peso dos seus filhos ou perceber que a sua curva de crescimento se afasta da normalidade. Progenitores com crianças com um peso normal preferiam que os seus filhos tivessem uma silhueta maior, ao passo que pais com filhos que apresentam já na infância problemas de excesso de peso mostram-se satisfeitos com a imagem corporal das crianças”, aponta Sarah Warkentin.
As preferências dos pais e o sexo da criança
Verificou-se que as mães eram quase três vezes mais insatisfeitas com a imagem corporal das suas filhas do que os pais. Notou-se uma clara preferência por raparigas com uma silhueta mais delgada, tanto da parte das mães como dos pais. No que toca aos rapazes, tanto mães como pais, preferiam rapazes com uma silhueta mais encorpada.
Estas escolhas poderão relacionar-se com “o ideal de corpo magro idealizado na nossa sociedade para as raparigas e com a desejabilidade de os rapazes terem um corpo mais forte e entroncado”, nota.
A influência da idade e da escolaridade da mãe
O estudo mostrou também que as mães mais jovens (menos de 30 anos) e com menor escolaridade (menos do 12º ano) desejavam silhuetas maiores para os seus filhos, independentemente de estes serem raparigas ou rapazes.
“Pensamos que este resultado se pode relacionar com a falta de conhecimento sobre saúde infantil entre estas mulheres, assim como com a crença, vigente entre pessoas que pertencem a níveis socioeconómicos mais baixos, de que uma criança é mais saudável se for mais pesada”.
Na investigação, observou-se uma maior probabilidade de as mães que tiveram filhos com baixo peso ao nascimento desejarem uma silhueta maior para as crianças, o que “está em linha com outros estudos, que demonstraram haver uma maior preocupação com o ganho de peso destas crianças, durante a infância”.
E será que pais insatisfeitos com a própria silhueta também revelam maior descontentamento para com a imagem corporal dos filhos? A resposta é: sim!
Tanto pais como mães que preferiam uma silhueta diferente da que tinham (seja mais delgada ou encorpada) mostraram maior insatisfação para com a imagem corporal dos seus filhos.
Mensagem de Saúde Pública
Para a investigadora do ISPUP, os vários resultados encontrados revelam a importância de se planearem intervenções junto de grupos específicos de pais, de forma a criar-se um ambiente favorável para que a criança construa uma imagem corporal adequada e saudável de si própria.
De acordo com a evidência encontrada no artigo, as intervenções devem centrar-se particularmente em pais que estão satisfeitos com o excesso de peso das crianças, em mães mais jovens e com baixa escolaridade, em pais e mães de raparigas e em todos os pais que estão insatisfeitos com a sua própria silhueta.
A investigação, designada Parents’ perceptions and dissatisfaction with child silhouette: associated factors among 7‑year‑old children of the Generation XXI birth cohort, contou também com a participação da investigadora Ana Henriques, e encontra-se disponível AQUI.
O estudo foi financiado pelo FEDER, a partir do Programa Operacional Factores de Competitividade – COMPETE e de financiamento nacional da Fundação para a Ciência e Tecnologia – FCT (Ministério da Educação e Ciência de Portugal), no âmbito dos projetos “Appetite regulation and obesity in childhood: a comprehensive approach towards understanding genetic and behavioural influences” (POCI-01-0145-FEDER-030334; PTDC/SAUEPI/30334/2017) e “Appetite and adiposity—evidence for gene–environment interplay in children” (IF/01350/2015).
Imagem: Unsplash/@renebbernal